Desde 2004, a Assistência Social se reconhece como uma política pública que tem, entre outros, o dever de garantir formas de convivência que protejam pessoas e grupos que sofrem com as injustiças e a desigualdade social.
O direito à convivência é um legado que a política pública de Assistência Social recebe das lutas sociais em favor do direito à convivência familiar e comunitária. A Luta Antimanicomial, o Estatuto da Criança e do Adolescente e o Estatuto do Idoso trazem
como diretriz de proteção e cuidado a premissa de que os cidadãos estão mais protegidos quando convivem em diferentes grupos, que lhe trazem sentimento de valorização e pertencimento. Portanto, as medidas de acolhimento institucional ou qualquer outra ação de restrição de convívio são sempre situações excepcionais. E, ainda que estejam em serviços de acolhimento, as pessoas têm direito a construir novas relações sociais e afetivas de referência para ancorar sua existência.
Há uma herança na Assistência Social que tem dificultado essa compreensão da convivência como direito. Essa herança está baseada no desconhecimento (ou na desconsideração) de que a vivência de injustiça social tem impacto nas redes de apoio e convívio das pessoas. Por isso, essa herança reduz essas pessoas à “necessidade material” ou busca disciplinar seus comportamentos por meio de palestras educativas, orientações e outras formas de “educar”, ignorando seus saberes, suas necessidades e potencialidades.
No vídeo abaixo, explicamos brevemente sobre essa herança.
O passado é lição para refletir, não para repetir.
Mario de Andrade
Em nosso trabalho de apoio e supervisão para as equipes, temos percebido certa dificuldade de compreensão e incorporação da convivência como direito nos serviços do SUAS, mesmo após 10 anos da publicação da Concepção de Convivência e Fortalecimento de Vínculos e mais de 10 anos da Tipificação Nacional dos Serviços Socioassistenciais (BRASIL, 2009).
Por isso, desde 2013 a Vira e Mexe vem divulgando a Concepção de Convivência e Fortalecimento de Vínculos e apoiando as equipes para transpor a compreensão da convivência como direito em suas práticas cotidianas com os usuários dos serviços de proteção básica e especial. Afinal, a matéria prima no dia a dia dos serviços é reconhecer, valorizar e ressignificar relações afetivas, de pertencimento social e de cidadania.
Temos desenvolvido metodologias com as equipes do SUAS para que percebam a importância do seu trabalho na criação e no fortalecimento de vínculos nos territórios de vivência da população. E temos contribuído para a aprofundar a compreensão de que conviver é parte do viver em sociedade e, numa sociedade tão desigual e violenta como a brasileira, trabalhar a convivência não se limita a um conjunto de atividades com começo, meio e fim com temas pré-estabelecidos.
Nossa aposta junto às equipes requer refletir e superar formatos limitados e “escolarizados” na reprodução de percursos em atividades socioeducativas; trabalhar com convivência é inovar as estratégias e dar espaço para a vida em suas diversas expressões.