No artigo anterior publicado aqui “Um olhar para a gestão entre o passado e o futuro” analisei a tradição da política da assistência social que a associa, prioritariamente, à entrega de benefícios materiais. Superar essa transição para construir parâmetros de cidadania – e não de gestão da pobreza – requer do coletivo de gestores/as e trabalhadores/as a construção de respostas que não sejam imediatas e automáticas.
As respostas válidas resultam da reflexão coletiva dos sujeitos envolvidos e são melhores quando consideram as condições reais e usam informações, instrumentos e possibilidades institucionais previstas nas diretrizes, legislações e normativas.
Além disso, é preciso que essas respostas considerem, pelo menos, dois elementos: 1) planejar as mudanças porque elas não acontecerão por “boa vontade”; 2) buscar apoio para aprimorar competências específicas de gestão.
Mudanças acontecem com planejamento
Planejar é, em grande medida, assumir compromissos com mudança. Nos projetos de educação permanente realizados pela Vira e Mexe adotamos o Planejamento Estratégico Situacional que traz um conjunto de princípios teóricos, procedimentos metodológicos e técnicas coerentes aos princípios de descentralização e participação que orientam a gestão do SUAS.
[…] O planejamento deve centrar sua atenção na conjuntura, no jogo imediato dos atores sociais. O contexto conjuntural do plano representa uma permanente passagem entre o conflito, a negociação e o consenso, é onde tudo se decide. É por isso que “planeja quem governa”, e “governa” quem, de fato, planeja. Quem tem capacidade de decisão e responsabilidade de conduzir as políticas públicas deve obrigatoriamente envolver-se no planejamento. (Toni, 2004)*
Portanto, valorizar o papel da gestão é também valorizar sua capacidade de produzir mudança com pessoas reais nos contextos históricos da vida coletiva.
Apoio para aprimorar competências
Após a Constituição Federal de 1988, as competências da gestão pública passam a ter dois atributos: ser descentralizada e participativa.
Todas as políticas sociais brasileiras se consolidaram investindo no aprimoramento das competências de gestão. No SUAS esta direção foi pactuada em dois documentos: a Política Nacional de Educação Permanente (CNAS, 2013) e no II Plano Decenal (2016-2026). Ambos os documentos reconhecem a importância do desenvolvimento das competências das equipes de referência do SUAS, responsáveis pelas funções de gestão.
Segundo essas orientações, o apoio para as equipes de gestão deve vir do governo federal e do governo estadual, por meio do apoio técnico. E também por meio de contratação direta do serviço de supervisão técnica pelos municípios .
Somente coletivos com alinhamento de propósitos e com horizontes compartilhados são capazes de criar futuros dentro das possibilidades do tempo presente.
Como diz o poeta mineiro Carlos Drummond de Andrade,
Não serei o poeta de um mundo caduco/ Também não cantarei o mundo futuro/ Estou preso à vida e olho meus companheiros/ Estão taciturnos, mas nutrem grandes esperanças/ Entre eles, considero a enorme realidade/ O presente é tão grande, não nos afastemos/ Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas.
*TONI, J. O que é o Planejamento Estratégico Situacional? Revista Espaço Acadêmico, nº 32, 2004.
Stela Ferreira, sócia diretora da Vira e Mexe