Vamos reencantar as conferências em 2025!

Ao longo da trajetória da Vira e Mexe, temos notado que estamos vivendo uma transição geracional das equipes que atuam nas políticas públicas, especialmente na assistência social. Sempre celebramos a chegada de novas(os) trabalhadoras(es) porque defendemos que política pública tem que ter continuidade e inovação. Contudo, também temos percebido que os sentidos de muitas conquistas e construções coletivas precisam ser atualizados. A participação nas conferências municipais é uma dessas conquistas nas quais constatamos muitas continuidades, mas poucas inovações. Por vezes, parece que nos acostumamos a um formato de conferência burocrático e formal para o qual são convidados palestrantes ilustres cujas mensagens nem sempre dialogam com as realidades locais, não comunicam numa linguagem que todos entendam e, tampouco, tocam nos pontos que precisam ser avaliados pelo coletivo ali presente. É preciso atualizar o sentido da participação para que as pessoas exercitem nas conferências o direito de expressar suas opiniões, avaliar e propor melhorias para situações que afetam coletivos ainda minoritários do ponto de vista político, como idosos, mulheres, negros, população LGBTQUIA+, pessoas com deficiência, e muitos outros. A mobilização desses grupos tem sido um desafio e os rituais de palestras, votação de propostas e eleição de delegados têm feito pouco sentido. ... Continuar Lendo

A importância da mobilização nas pré-conferências

As conferências municipais são uma conquista dos movimentos populares em defesa da maior participação da sociedade civil, sobretudo de cidadãos e cidadãs, no planejamento e indicação de prioridades das políticas públicas. O direito à participação foi reconhecido na Constituição Federal de 1988 e a realização das conferências de políticas públicas é parte dessa “arquitetura da participação”. No entanto, após mais de 30 anos, permanece o desafio de garantir a participação no cotidiano das políticas públicas. Esse desafio se evidencia nos dias de hoje de duas formas. Nas áreas em que as conferências são obrigatórias por lei, como a conferência da cidade, da saúde e da assistência social, entre outras, muitas pessoas avaliam que a participação nesses espaços é insuficiente, tanto do ponto de vista quantitativo como qualitativo. Em outras áreas como promoção da igualdade racial e dos direitos da população LGBTQIA+, a realização das conferências nos três níveis de governo não é obrigatória por lei. Nessas áreas, os movimentos de defesa de direitos humanos, órgãos de defesa e as comissões legislativas têm tido um papel fundamental na mobilização e realização do direito à participação desses grupos. O enfrentamento e superação desses desafios depende, em grande medida, do trabalho de mobilização ... Continuar Lendo

Participação de crianças e adolescentes no acolhimento institucional

Como assegurar convívio protetivo a crianças e adolescentes em situação de acolhimento institucional? Essa foi a pergunta que mobilizou os encontros de apoio às equipes das casa-lares, realizado pela organização social IJEPAM, em parceria com as prefeituras de Ituverava e Miguelópolis, no interior de São Paulo. A música de Marcelo D2 inspirou um caminho de reflexões e descobertas. Assim como o arco e a flecha, quanto mais esticarmos o arco para trás, mais longe irá a flecha. Com essa inspiração, olhamos para as práticas passadas do acolhimento institucional que, ao refletir seu viés moralista, reproduz violências contra crianças, adolescentes e suas famílias. Para superar essas práticas, é necessário que todas as pessoas da equipe conheçam a legislação, reflitam sobre o trabalho, estudem e, especialmente, escutem as crianças e adolescentes para poder impulsionar a flecha em direção a um futuro mais sensível e mais participativo. A segurança para fazer o trabalho nesse serviço tão complexo vem da construção de vínculos de confiança e respeito no dia a dia. Ao longo desses cinco meses, contribuímos para fortalecer essa confiança tão necessária entre as equipes e as crianças, adolescentes e suas famílias. Com um planejamento coletivo e um tanto de coragem e disponibilidade ... Continuar Lendo

Diálogos entre bell hooks e a Assistência Social

Que bell hooks é uma inspiração nos processos de educação permanente realizados por nós, da Vira e Mexe, todo mundo sabe. O que talvez ainda não seja de conhecimento de todo mundo é que essa pensadora estadunidentense, autora, militante antirracista e feminista, também nos ajuda a pensar a essência da proteção da política de Assistência Social. Vem que a gente explica melhor! No livro Ensinando comunidade: uma pedagogia da esperança, bell hooks (a grafia do nome é com minúscula por desejo da própria) apresenta em 16 ensinamentos o que aprendeu ao longo de décadas. Como educadora de estudantes que eram, em sua maioria, negros, imigrantes e gays, ela sempre teve uma atitude esperançosa e de combate ao pensamento colonizador e elitista que circulava pelos corredores das universidades onde deu aula. Ela nos inspira porque reconhecemos em seu modo de pensar e agir, ensinamentos valiosos para quem trabalha na Assistência Social, uma política pública que lida com os impactos das desigualdades nas formas de convivência das pessoas em diferentes espaços da vida. No oitavo ensinamento, bell hooks nos adverte com precisão: para acabar com as práticas discriminatórias, garantir acessos igualitários não é suficiente. E ela fundamenta essa ideia argumentando que os ... Continuar Lendo

Como atualizar as concepções e práticas de gestão no Sistema Único de Assistência Social?

No artigo anterior publicado aqui “Um olhar para a gestão entre o passado e o futuro” analisei a tradição da política da assistência social que a associa, prioritariamente, à entrega de benefícios materiais. Superar essa transição para construir parâmetros de cidadania – e não de gestão da pobreza – requer do coletivo de gestores/as e trabalhadores/as a construção de respostas que não sejam imediatas e automáticas. As respostas válidas resultam da reflexão coletiva dos sujeitos envolvidos e são melhores quando consideram as condições reais e usam informações, instrumentos e possibilidades institucionais previstas nas diretrizes, legislações e normativas. Além disso, é preciso que essas respostas considerem, pelo menos, dois elementos: 1) planejar as mudanças porque elas não acontecerão por “boa vontade”; 2) buscar apoio para aprimorar competências específicas de gestão. Mudanças acontecem com planejamento Planejar é, em grande medida, assumir compromissos com mudança. Nos projetos de educação permanente realizados pela Vira e Mexe adotamos o Planejamento Estratégico Situacional que traz um conjunto de princípios teóricos, procedimentos metodológicos e técnicas coerentes aos princípios de descentralização e participação que orientam a gestão do SUAS. […] O planejamento deve centrar sua atenção na conjuntura, no jogo imediato dos atores sociais. O contexto conjuntural do ... Continuar Lendo

Um olhar para a gestão entre o passado e o futuro

Em 2025, muitos municípios estão passando por mudanças na composição das equipes de gestão. Nesse contexto, é importante dizer que essas equipes escreverão, junto com outros atores, uma parte da história da política pública sob sua responsabilidade. E como disse o poeta Mário de Andrade, “o passado é lição para refletir e não para repetir.” Todas as políticas sociais brasileiras tiveram que lidar com seu passado e suas tradições. Nesse processo, tiveram que definir melhor seu campo de atuação específica, ou seja, sua especialidade setorial. Cito alguns exemplos. O direito à saúde pública passou por amplos debates e construções coletivas para afirmar que saúde “é o estado de completo bem-estar físico, mental e social e não apenas a ausência de doença.” O campo da educação pública também mobilizou amplos coletivos para definir que o direito à educação “não se limita à garantia de matrícula em uma escola”, significa assegurar o direito de aprender. O direito à assistência social passou por debates que resultaram na definição do seu campo específico nomeado como “seguranças” para enfrentar as inseguranças dos cidadãos no campo material (segurança de sobrevivência por meio de benefícios) e no campo das relações sociais marcadas por profundas desigualdades (seguranças de ... Continuar Lendo

2025 é ano de conferências, de diálogos e de esperança!

Abigail Torres No processo de democratização do país, ao encerrar-se os anos sombrios de ditadura militar, buscou-se assegurar garantias legais para que os governos estivessem mais alinhados à vontade popular. Medidas foram adotadas para que cidadãs e cidadãos pudessem manifestar-se sobre as ações do Estado, não só por meio do voto para representantes que ocupam os cargos do Legislativo e Executivo, mas também participando da escolha das prioridades a serem contempladas na atuação do Estado brasileiro. As conferências municipais, em diferentes políticas públicas, são exemplos dessas medidas que objetivam tornar mais evidente para os governos as situações vividas pelas pessoas, seus sofrimentos, as estratégias que adotam para sobreviver em meio às desigualdades, assim como a opinião que têm sobre os serviços públicos e as mudanças que esperam que ocorra nas unidades em que são atendidas. Em resumo, as conferências são espaços para que todas as pessoas interessadas (trabalhadores/as da área, gestores/as e todas as cidadãs e cidadãos atendidos nos serviços) possam avaliar as ações dos governos e seus impactos na realidade em que vivem. Ao mesmo tempo, indicam as medidas prioritárias para ampliar a qualidade da atenção nos serviços públicos. Essa possibilidade de “partilha do poder de decisão” chamamos de ... Continuar Lendo

O papel do SUAS na garantia do direito à convivência social

Abigail Torres A tese de doutorado da psicóloga Ana Carolina Valentim (1), analisando sua atuação no Ministério Público em SP, nos anos de 2013 a 2018, atesta como a lógica de manicômio impera onde os pactos legais não chegam e são ignorados. A análise da pesquisadora é baseada em suas visitas às unidades de assistência social e de saúde na sua função de apurar denúncias e fiscalizar o funcionamento. A autora afirma em seu trabalho que essas unidades expressam o violento funcionamento manicomial, sob uma fachada de instituições de cuidado e proteção. Valentim ressalta que para construir uma sociedade sem manicômios [e que respeita o direito à convivência] é necessário que a própria sociedade entenda seus conflitos como parte de si. Essa postura não passa somente pelo tipo de serviço que será ofertado, como também pelas relações que são estabelecidas e que geram a resposta nesses serviços. As violações aos direitos humanos, independentemente do agente causador, exigem intervenção pública para reparação e proteção. Portanto, há atribuições específicas do SUAS na atenção ao cidadão e à cidadã que vive violações geradas por intolerância e crimes de ódio. A proteção social humana é resultante de um conjunto de relações e acessos aos ... Continuar Lendo

Direito à convivência social é uma expressão de direitos humanos

Por Abigail Torres Há tempos temos defendido a direta relação entre proteção de direitos humanos e convivência social como segurança no SUAS. Para nós, essa relação se estabelece ao reconhecer a responsabilidade pública por produzir reparação e proteção a grupos que têm seus direitos violados, por meio do trabalho nos serviços socioassistenciais. O reconhecimento da convivência social como direito é uma afirmação presente em diferentes legislações após a Constituição Federal de 1988. A Carta Magna traz uma direção importante para o trato das relações sociais como objeto de intervenção de políticas públicas ao explicitar a responsabilidade estatal pelo fomento a uma sociabilidade democrática e fortalecedora dos sujeitos, especialmente, ao estabelecer medidas de proteção e de reparação para vítimas de crimes de ódio. Passa então a ser obrigatória a oferta de oportunidade de convivência social protetiva, respeitosa, democrática e promotora do desenvolvimento humano. O que requer, por consequência, a revisão das metodologias de trabalho social desenvolvidas em serviços públicos para que sejam realmente inclusivas. Para tanto é preciso que estejam permeadas e conectadas com as pautas e ações de defesa dos direitos humanos. Dialogar sobre convivência social como um direito requer olhar para a presença histórica de processos de institucionalização, ou ... Continuar Lendo

“Tudo que nós tem é nós” (Emicida) – 20 ideias para melhoria dos serviços do SUAS nos territórios

Talvez nem em seus sonhos mais esperançosos, o rapper e compositor Emicida tenha imaginado que seria a grande inspiração para a capacitação de profissionais da Assistência Social, estimulando a reflexão sobre o trabalho e a proposição de melhorias no fazer cotidiano para atender melhor os usuários, cidadãos e cidadãs dos serviços socioassistenciais. Compartilhamos aqui alguns aprendizados do percurso formativo que a Vira e Mexe conduziu junto às equipes do SUAS em Vitória da Conquista, cidade do interior da Bahia, com cerca de 400 mil habitantes. Conquista, como é conhecida, é um polo de serviços de educação e comércio, que somada ao desenvolvimento industrial, confere ao município um lugar de destaque na economia do estado. Os encontros aconteceram de abril a outubro de 2024 com cerca de 100  trabalhadores, das equipes e da gestão. A formação foi pensada e conduzida por Abigail Torres e Yheda Gaioli da Vira e Mexe. Para iniciar o percurso, as trabalhadoras identificaram os principais desafios para a realização do trabalho social e as facilitadoras da Vira e Mexe construíram um caminho para apoiar as equipes no fortalecimento do trabalho social com famílias e territórios. Ao final, as participantes foram convidadas a refletir sobre os aprendizados construídos ... Continuar Lendo