Balanço das conferências municipais 2023

Após participar de quase 20 conferências municipais em cidades de portes distintos no sudeste e nordeste do país, reafirmamos nossa percepção sobre a urgência de mudanças nos rituais dos espaços de participação no SUAS. Essa pauta para nós, da Vira e Mexe, é bem antiga. Há anos temos estimulado as equipes a criar e produzir espaços preparatórios de conferências utilizando linguagem acessível e assegurando o predomínio de fala de cidadãs e cidadãos em detrimento de fala de autoridades e de técnicos/as. Sobretudo, fazendo boas perguntas que permitam a narrativa do cotidiano em suas dores e resistências, propiciando que o debate central das conferências seja pautado pela escuta e avaliação dos serviços e das demandas e propostas das pessoas para quem os serviços foram propostos. Estamos longe dessa vivência. Há reuniões, encontros e congressos voltados a gestores/as e trabalhadores/as, nos quais se analisa o financiamento, as relações intergovernamentais, as articulações com outras políticas públicas e entre os serviços do SUAS, os desafios da profissionalização das equipes e a relação com organizações sociais. São múltiplos espaços em que são analisados os desafios da gestão, nem sempre associando à ampliação de acesso a direitos de usuários e usuárias. Esses debates são necessários, dada ... Continuar Lendo

Estratégias coletivas são foco da formação em Catanduva (SP)

No período de janeiro a junho de 2023, a equipe da Vira e Mexe realizou um processo de supervisão e apoio às equipes da proteção básica, especial e de gestão do município de Catanduva (SP) com cerca de 40 profissionais. Ao longo dos seis meses de trabalho, foi construído um vínculo de confiança das facilitadoras, Stela Ferreira e Yheda Gaioli, com as equipes de Catanduva e isso possibilitou alcançar resultados que indicam mudanças nas decisões e nas práticas das equipes. O método participativo desenvolvido, baseado no “aprender fazendo” e nas vivências coletivas, pavimentou o caminho para um aprendizado muito significativo para a Vira e Mexe e para as equipes do SUAS de Catanduva. Uma das participantes, ao avaliar o método de formação afirmou: “A metodologia aplicada durante o curso foi um fator importante. As consultoras não ficaram focadas apenas em teorias e realizaram atividades e oficinas em grupos através das dinâmicas. Isso fez com que eu refletisse sobre a maneira de como tenho desempenhado e executado o meu trabalho enquanto trabalhadora do SUAS. Para mim, o que fez a diferença foi a ótima didática apresentada pelas consultoras durante a capacitação em formas práticas de se aplicar o conteúdo.” Para Fernanda ... Continuar Lendo

Eixos temáticos devem apontar para a reconstrução do SUAS

Neste ciclo de Conferências de 2023, o foco principal indicado pelo Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS) é a “reconstrução do SUAS”. Para nós da Vira e Mexe, a reconstrução passa, necessariamente, pela análise da realidade conjuntural do SUAS neste momento de crise social agravada pela pandemia. Esse mergulho no real cria novas possibilidades para os debates sobre os eixos da conferência, invertendo o que se tem feito nos debates em conferências. Nossa premissa é que para analisar uma política pública é necessário reconhecer o impacto de sua presença na vida das pessoas, que se expressa no alcance, ou não, de suas finalidades. Para isso, é necessário tornar visível todas as demandas não atendidas, quer seja pela falta de acesso das pessoas aos seus direitos, quer seja pela baixa qualidade da atenção a quem acessou os serviços e benefícios públicos. E quando atentamos para demandas não atendidas ou dificuldades de acesso, é importante ressaltar que quem tem maior capacidade de falar a respeito é, justamente, o cidadão e a cidadã que está vivendo injustiças e desigualdades. Deste modo, para nós, os eixos propostos pelo CNAS são uma direção porque trazem elementos que estruturam a gestão do SUAS – financiamento, controle ... Continuar Lendo

Pré-conferências dão sustentação à conferência municipal

Em maio, a Vira e Mexe assessorou a realização da Conferência Municipal de Assistência Social de Valparaíso, município do interior de São Paulo, na região de Araçatuba. Abigail Torres, sócia diretora, fez a fala de abertura da conferência e apoiou o trabalho dos grupos. “A experiência de Valparaíso merece destaque especialmente por ter favorecido uma maior participação ativa de usuários e usuárias nos espaços de controle social”, ressaltou. Os usuários somavam cerca de 30% do total de participantes da conferência de Valparaíso. Silvia Renata, secretária executiva do Conselho Municipal da Assistência Social, conta que foram realizadas quatro pré-conferências no município, das quais uma foi exclusivamente com usuários e usuárias dos serviços. Nestes encontros preparatórios, as pessoas participantes avaliaram o SUAS na cidade e levantaram propostas dos usuários para fazer avançar a proteção. Já na abertura da conferência, os diálogos foram iniciados com vídeos-depoimentos de usuárias e usuários sobre os impactos em suas vidas ao serem incluídos em serviços e benefícios socioassistenciais. Estes depoimentos haviam sido coletados previamente por diferentes agentes e conselheiros/as do SUAS do município. Num plenário com vários adolescentes, mulheres e idosos, a conferência municipal de Valparaíso teve espaços para trabalhos em grupos facilitados pelas equipes que estimularam ... Continuar Lendo

O SUAS no combate ao racismo

A visibilidade do sofrimento ético-político das cidadãs/dos cidadãos e a construção coletiva de padrões de justiça social passa, necessariamente, pelo enfrentamento do racismo institucional no SUAS por meio da sensibilização, tomada de consciência, debate e mudanças de práticas. É fundamental iniciar um profundo e duradouro processo de reparação histórica à população negra brasileira, que passa pelas lutas contra os pilares que sustentam nosso racismo estrutural: econômico, político e de produção de subjetividades.  Diante dos efeitos devastadores da pandemia para a população negra, é urgente inserir a pauta antirracista nas intervenções do SUAS, fortalecendo estratégias como: Se é verdade que “todo sofrimento pode ser suportado se conseguirmos convertê-lo numa história ou se contarmos uma história sobre eles” (Chimamanda Adichie), então podemos nos comprometer hoje com a construção de histórias que convertam abandono e violência em proteção e convertam invisibilidade em reconhecimento. A luta será longa, mas certamente em boa companhia porque há muitas de nós, brancas e negras, trabalhadoras, e usuárias na luta contra o racismo. Abigail Torres e Stela Ferreira, sócias diretoras da Vira e Mexe ... Continuar Lendo
Formação com trabalhadores da Assistência Social de Franca (SP)

Encantamentos, produção de sentidos e de modos de fazer

Nos dias 7, 8 e 9 de novembro, a Vira e Mexe realizou oficinas com as equipes do Centro POP, dos serviços de acolhimento noturno, abrigo e casa de passagem e todos os serviços voltados à pessoa em situação de rua no município de Franca/SP. Ao todo, participaram cerca de 80 trabalhadores, entre cuidadores, educadores sociais, psicólogas e assistentes sociais. As oficinas foram coordenadas por Lucas Carvalho e Ricardo de Paes Carvalho, profissionais com longa trajetória no trabalho social com pessoas em situação de rua.  “Na grinfa de memórias e experiências, ruminamos muitos trabalhos já feitos. Querendo ou não, o gosto, carinho, respeito e admiração por essa população dita como vulnerável, só cresce dentro de nós. [Foi] uma oportunidade de desenvolver ainda mais o que já fizemos em nossa longa caminhada.” Aceitando um convite alegre e generoso de partilha, as pessoas “celebraram a alegria e a paixão pelo que fazem, o respeito que tinham pelas pessoas que fazem uso dos Serviços em que trabalham, o reconhecimento e valorização de que atuar no SUAS é um catalisador de crescimento pessoal e profissional”, nos conta Lucas Carvalho. Para viabilizar a participação de todos, cuidamos para que educadores e cuidadores, cujas jornadas de ... Continuar Lendo

Diálogos sobre o SUAS com servidores públicos de Jundiaí

Sempre recebemos com alegria e entusiasmo o convite dos municípios para disseminar ideias e conteúdos sobre o trabalho social no SUAS para um público mais amplo. Em setembro, Jundiaí (SP) nos deu a oportunidade de participar das atividades do 1º Mês do SUAS, uma iniciativa da gestão municipal que promoveu seis encontros semanais trazendo contribuições de diferentes especialistas da área. Esses encontros, no formato de seminários e oficinas participativas, tiveram como objetivo fortalecer os servidores públicos do SUAS para aprimorar seus conhecimentos e práticas no cotidiano dos serviços socioassistenciais. Em nossa participação no seminário sobre “Lógica sistêmica do SUAS”, disseminamos ideias importantes contidas no projeto institucional do SUAS a partir da Política Nacional de 2004. E pudemos dialogar sobre os principais impactos que a organização desta política pública como sistema único trouxe para o trabalho social. Entre esses impactos destacar que na organização por sistema operamos com a lógica do “e” e não do “ou”. Na lógica de sistema quando cada um define “o que é seu”, por consequência, está definindo o trabalho do outro, ou seja, se eu digo – “O CRAS faz até aqui e daqui pra frente é o CREAS que assume”, automaticamente está dito pelo CRAS ... Continuar Lendo

A construção de diálogo entre equipes da básica e da especial em Guararema (SP)

“Um dos maiores desafios era a construção de um trabalho articulado entre as equipes da proteção básica e da proteção especial, como nos foi relatado pelas equipes logo no início” conta Stela Ferreira, sócia diretora da Vira e Mexe sobre o trabalho de apoio técnico e supervisão às equipes do SUAS do município de Guararema (SP) com foco no fortalecimento do trabalho social com famílias. Foi um processo de 10 meses com oficinas presenciais e virtuais, coordenadas por Stela Ferreira e She Nilson, envolvendo cerca de 30 trabalhadores e trabalhadoras. A coordenadora do CREAS de Guararema, Joseane, lembra como havia falta de alinhamento entre as equipes antes e as mudanças que ocorreram a partir da formação com a Vira e Mexe. “Para falar para outras políticas a gente precisaria também se entender. A maior diferença que eu percebi no cotidiano foi essa necessidade de comunicação internamente. E quando a gente muda isso e consegue enxergar, a gente começa a buscar diálogo e isso nos fortalece para a gente conseguir falar para fora; acho que isso foi a maior diferença que a gente teve no trabalho” conta. Stela ressalta que um dos resultados positivos foi o envolvimento de diferentes pessoas das ... Continuar Lendo

A “caixa-preta” do Auxílio Brasil

Hernany Castro[1] Algoritmos são classificadores construídos por operadores de decisões políticas para gerar determinado resultado. São sequências de códigos, instruções e operações, elaboradas em linguagem informática, voltadas para a programação de cálculos, equações e problemas matemáticos específicos, no presente caso, desenvolvidas a partir de critérios previstos em normas do Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal (Cadastro Único) e do programa Auxílio Brasil. No entanto, as regras legais dos programas sociais não migram direta e automaticamente da “letra fria” da norma para dentro do “sistema”. Essas regras, aliás, não são propostas pelo legislador para esse tipo específico de aplicação. Portanto, há necessidade de uma interpretação para viabilizar a aplicação do algoritmo. Desse modo, o operador realiza a “tradução” dos critérios previstos na norma para dentro do “sistema”, convertendo-os em linguagem que permitirá ao computador e respectivos softwares a leitura e a aplicação do comando. Minha hipótese é que parte considerável dos problemas da chamada “fila” do Cadastro Único e do Auxílio Brasil estão relacionados aos algoritmos, para os quais não se traduz tão somente as regras do programa social, mas também um conjunto unívoco de escolhas pessoais que envolvem disposições, bens e práticas simbólicas, valores, crenças e preconceitos de ... Continuar Lendo

Avaliação de resultados dos serviços do SUAS

Stela Ferreira Nossa reflexão sobre a importância de avaliação de resultados da assistência social está ancorada no nosso trabalho de apoio e supervisão das equipes do SUAS. Temos notado que a insuficiente compreensão das aquisições e dos resultados esperados do trabalho social no SUAS tem várias consequências. A primeira dessas consequências é apresentada para nós pelas equipes como falta de sentido para o trabalho cotidiano. Isso gera desmotivação e insatisfação pela percepção de que o trabalho social pouco contribui para mudanças significativas na vida dos cidadãos. Outra forma como essa insuficiente compreensão sobre os resultados dos serviços do SUAS se manifesta é na expectativa de que “tudo se resolva pela intersetorialidade”. É frequente a ideia de que para os serviços socioassistenciais alcançarem seus resultados, todas as demais políticas públicas precisariam funcionar plenamente. Pelo princípio da incompletude de todas as políticas sociais essa ideia é adequada, visto que na vida das pessoas as demandas de proteção social estão marcadas por suas trajetórias coletivas com muitas barreiras de acesso. Porém, a saúde e a educação, por exemplo, têm resultados próprios a alcançar e que não dependem do funcionamento da assistência social para serem alcançados. O mesmo se dá com a assistência social: ... Continuar Lendo